Padaria grande e vistosa do bairro Chácara Primavera, cheia de gente na Segunda-Feira véspera de feriado, dia seis de Setembro, à noite. Muitas pessoas comprando pães, doces, leite e itens de conveniência. Mas a maioria delas está reunida em torno do buffet de sopas e torradas - grupos, famílias, amigos, casais. As três garçonetes, morenas de cabelos presos, duas mais velhas e uma mais nova, correm com as carinhas preocupadas, carregando bandejas para servir e canetas com bloquinhos para tirar os pedidos.
A Segunda-Feira é fria e de muito vento. Existe o cardápio recheado de opções – dentre elas sanduíches e pizzas - mas escolher a sopa faz sentido, porque aquece e alimenta. Além disso, é feriado no dia seguinte. É possível demorar, sentar e degustar as opções do buffet. As crianças não têm aula, os pais não trabalham, os namorados podem ficar juntos. Há sopas de sabores variados: frango com mandioquinha, carne com legumes, grão de bico e creme de espinafre. Todas organizadas em panelas grandes de tampa de vidro transparente, colocadas sobre um richaud para se manterem aquecidas. Além das sopas, colocadas sobre pratos espalhados no buffet em formato de “L”, estão torradas, croutons, biscoitos e pães para acompanhar. Tem até sobremesa, um mousse de limão com base de bolo de chocolate. Tudo delicioso e à vontade, por R$18,90. Cumbucas para a sopa, pratinhos para acompanhamentos e sobremesa. Bandejas e talheres para auxiliar – estes últimos, embalados um a um em saquinhos plásticos, passando a sensação de higiene que não sei se é verdadeira.
Na mesa mais próxima do buffet, um grupo de amigos com seus filhos de menos de 10 anos à tiracolo. As crianças não param quietas. São três, dois meninos e uma menina, mas parecem estar em maior número por conta da agitação. Há apenas seus tênis e sandálias espalhados no chão ao redor da mesa para registrar sua presença estável ali. Os pais, quase que donos do espaço e pouco ligando para a algazarra e para a bagunça dos calçados, conversam animadamente – dois homens, duas mulheres. Uma delas, loira, meia idade, cabelos lisos e na altura dos ombros, está sentada e fala alto. Sua camiseta ajustada ao corpo, cor de rosa-choque com a marca “Puma” estampada em pontinhos brilhantes no peito, aliada às suas gargalhadas sonoras, não deixa negar que existe alguma necessidade de chamar a atenção para sua presença.
- Ah, mas no Free Shop vale a pena mesmo. Lá você encontra isso e é muito mais barato. O Free Shop é muito melhor. – diz a mulher de camiseta rosa, em alto e bom tom, deixando todos saberem que ela já viajou para o exterior.
Os homens, sentados de frente para ela, que está ao lado de sua amiga, pouco se fazem notar. Um grisalho, um moreno, ambos usando agasalhos para o dia frio e falando baixo, embora sorrindo. A amiga, de cabelos pretos, cacheados e longos, mas presos, e óculos de grau com lentes finas e retangulares, também é mais discreta. Vestida de preto – saia e blusa de lã - ela levanta algumas vezes para pegar sopa. A loira se mantém no mesmo lugar, sua cumbuca parada. Sua posição é diagonal à mesa, voltada para o lado da amiga, e as pernas, cruzadas. Em certo momento, o menino maior vem falar com a amiga morena, a menininha loira e de vestido vem conversar com a mãe de cabelos da mesma cor, e as gargalhadas ficam mais discretas. O grupo se prepara para ir embora, todos de barriga cheia e felizes.
A padaria também tem um Delivery de pizza, que trabalha a todo o vapor. As pizzas são preparadas na hora de acordo com os pedidos feitos pessoalmente ou por telefone (há uma pilha de folders por sobre o balcão trazendo todos os sabores, com ímas no verso para serem dependurados na geladeira), por dois pizzaoilos que usam chapéus de chefs de cozinha e roupas brancas. Ambos ficam no cantinho da pizza, formado por uma mureta que cerca o canto ao lado do buffet, e é fechada por um vidro, através do qual é possível ver os dois cozinheiros trabalhando freneticamente, e as pilhas de caixas de pizza, recém feitas. Existe um vão no vidro, que possibilita os pedidos de quem vai até a padaria. Ali para um homem de seus 30 anos, alto, moreno ficando careca, barriga em crescimento pela cerveja com churrasco aos finais de semana. Vestido de camisa azul de listrinhas brancas com mangas compridas mas arregaçadas, cinto e sapatos pretos e calça jeans escura, o homem traz óculos de sol pretos sobre a testa de cabelos parcos, e já é noite. Ele conversa animadamente com jeito marrento e sorriso torto com um dos pizzaiolos, enquanto aguarda seu pedido. Fica ali por cerca de 10 minutos, pega sua pizza, e então cai embora em direção ao caixa, peito estufado.
Um trio de amigos chega próximo ao buffet de sopas. Duas mulheres loiras e jovens de cabelos muito curtos, e um rapaz de óculos de grau. Elas analisam o buffet enquanto ele vai guardar a mesa de quatro lugares, defronte o cantinho da pizza. Elas então se juntam ao rapaz, são atendidas pela garçonete, e logo se dirigem ao buffet.
Atrás deles, um casal que parece ser de namorados ocupa uma mesa, um sentado de frente para o outro. Ambos são gordinhos. Eu e meu marido somos o casal que ocupa a mesa atrás deles, e estamos sentados na mesma posição. Da onde me sento, consigo ver bem somente a mulher, de costas para mim. Ignorando o frio, ela usa camiseta esverdeada de mangas curtas, bermuda bege e sandálias sem salto de plástico roxo, com os cabelos enrolados longos, pretos e cheios, presos. Se senta meio de lado, uma das pernas esticada para a sua direta. Ela é displicência, desânimo e falta de disposição. Quando me levanto para pegar minha sopa, consigo ver seu olhar perdido, mão levada à boca mordendo as unhas. O homem gordo de regata branca e short puído à sua frente pouco demonstra reação, e olha para o nada. Suas bandejas repousam com as cumbucas sobre a mesa, já cheias e de novo esvaziadas, as sopas já no estômago. Os dois pouco conversam. Ficam ali, fazendo tempo.
Há mais pessoas ao meu lado, atrás de mim, no segundo andar de mesas da padaria que também tem uma brinquedoteca, e também na seção de pães e produtos em geral. A padaria está mesmo cheia e é agradável estar ali, compartilhando daquele local de frescor e simplicidade. Mas já tomei minha sopa, comi pãezinhos e a sobremesa, meu marido comeu seu sanduíche de hambúrguer de picanha e queijo na falta da sopa preferida de creme de palmito, e nos levantamos para irmos embora, para casa.
É noite e faz frio, e nosso sofá quentinho nos espera, com CQC na televisão. Que delícia.